X CONGRESSO BRASILEIRO DE MASTOZOOLOGIA

Dados do Trabalho


TÍTULO

COMPETIÇAO E COEXISTENCIA DE ONÇA-PINTADA E ONÇA-PARDA EM UM REMANESCENTE DE MATA ATLANTICA: INVESTIGANDO O NICHO TROFICO

Resumo

A onça-pintada (Panthera onca) e a onça-parda (Puma concolor) são os maiores felinos das Américas e apresentam grande sobreposição no uso do habitat e no consumo de presas, possuindo elevado potencial de competição. Com isso, é esperado que esses felinos apresentem diferenciação em algum componente do nicho ecológico, considerando as dimensões trófica, espacial e/ou temporal, para que a coexistência seja possível. O presente estudo objetivou determinar o espectro trófico de onças-pintadas e onças-pardas em um remanescente de Mata Atlântica para verificar o grau de sobreposição da dieta e avaliar se existem mecanismos de coexistência relacionados ao compartilhamento ou segregação de presas. Para isso, foi realizada a análise de amostras fecais coletadas entre 2006 e 2018 em estradas não pavimentadas internas à Reserva Natural Vale (RNV; Linhares/ES). Foram obtidas 90 amostras fecais de onça-pintada e oito de onça-parda. A porcentagem de ocorrência (PO) de cada presa foi calculada e, para tornar a análise mais parcimoniosa, foram avaliadas apenas as presas principais (PO>5%) consumidas pela onça-pintada devido ao número reduzido de amostras de onça-parda. Foi calculada então a sobreposição de nicho de Pianka com base na PO das presas principais. A dieta da onça-pintada foi composta por 136 itens, distribuídos em 18 táxons, sendo Tayassuidae (Tayassu pecari + Pecari tajacu; PO=27,9%), capivara (Hydrochoerus hydrochaeris; PO=19,1%), quati (Nasua nasua; PO=18,4%) e paca (Cuniculus paca; PO=8,1%) as presas principais. A dieta da onça-parda foi composta por 12 itens, com consumo de capivara (PO=50,0%), paca (PO=25,0%), quati (PO=16,6%) e tapiti (Sylvilagus brasiliensis; PO=8,3%). Houve média sobreposição de nicho trófico (0,631), com compartilhamento de três espécies de presas. Apesar do compartilhamento de presas, a capivara foi a presa mais consumida pela onça-parda, a qual apresentou PO menor para onça-pintada, de forma semelhante ao observado para a paca. A PO do quati foi semelhante para as duas espécies. Tayassuidae foi consumida apenas pela onça-pintada, representando a presa mais importante na dieta deste predador. O tapiti foi representativo apenas para onça-parda. A similaridade na composição de presas principais e o valor de sobreposição de nicho indicam elevado potencial de competição por recursos tróficos entre as duas espécies. Por outro lado, a existência de presas não compartilhadas e a diferenciação da PO de presas consumidas por ambos predadores sugerem mecanismos que podem reduzir a competição, favorecendo a coexistência desses grandes felinos. Entretanto, considera-se que o nível de diferenciação do nicho trófico, por si só, pode não ser suficiente para manter a coexistência dos dois predadores, sendo necessária a ocorrência simultânea de diferenciação de outras dimensões do nicho para redução de interações agonísticas. Neste sentido, o número reduzido de amostras fecais de onça-parda, apesar do esforço de amostragem não diferenciar espécies, pode ser um indicativo de segregação espacial, onde as onças-pardas estariam evitando o uso de estradas internas à RNV (corroborado por dados de armadilhamento fotográfico). Dessa forma, sugere-se que a coexistência desses grandes felinos na RNV possa ser favorecida pela diferenciação conjunta de duas dimensões do nicho ecológico, considerando peculiaridades no uso dos recursos alimentares e segregação espacial.


Palavras-chave

Compartilhamento de presas, Ecologia trófica, Grandes felinos, Partição de nicho, Segregação espacial.


Financiamento

FAPES-VALE (Projeto 510/2016) e UVV (Projeto M01-2017PI002)


Área

Ecologia

Autores

Ana Carolina Srbek-Araujo, Hilton Entringer Jr, Hermano José Del Duque Jr, Adriano Garcia Chiarello, Francisco Palomares