Olhar para além do adoecimento: a experiência da presença da psicologia na visita multiprofissional da enfermaria cardiológica no Hospital das Clínicas da UFBA, em Salvador-BA
O presente relato de experiência se propõe a explanar sobre a participação da psicologia no momento das visitas de equipe, na enfermaria cardiológica do Hospital das Clínicas da UFBA. Pimentel (1998) aborda a “necessidade de se conhecer a pessoa que tem a doença e não o inverso”, compreender o paciente como um ser singular e plural, que tem suas subjetividades e sua história e não apenas como uma doença a ser tratada. O discurso da ciência médica tende a objetivar e universalizar o sujeito, de forma a excluir a singularidade de cada um, o que termina por despersonificar aquele que está acometido de um adoecimento, tornando-o a própria doença. É salutar compreender o paciente do ponto de vista do próprio sujeito, compreendendo a subjetividade do outro nessa experiência de adoecimento, conforme Nascimento (2013), assim será possível compreender o que é sofrimento para o paciente, que é quem está sob a atenção e os cuidados e não a equipe. Tal conduta não anula, obviamente, os cuidados necessários a conduta do caso clínico, mas ao compreender o paciente por uma ótica mais ampla permite consequentemente compreender as demandas deste sujeito, fator que ajuda na vinculação com a equipe. O serviço de psicologia da enfermaria de cardiologia tem como plano de atividades a presença na visita de equipe, que consiste em um momento de reunião de toda a equipe multiprofissional são compartilhados os planos de cuidado; participação no grupo Compartilhar, que consiste em ser um espaço ofertado tanto aos pacientes quanto aos egressos da referida enfermaria, fomentando a troca de informações e experiências vividas por cada um, favorecendo a construção de laços sociais; atendimento psicológico aos pacientes e/ou seus familiares, sendo ofertado a todos que são admitidos nessa unidade uma escuta psicológica, visando identificar demandas e assim trabalhar questões mobilizadoras ao paciente ou familiar, realizando o acompanhamento psicológico daqueles que necessitarem e desejarem este espaço. Trazemos aqui dois casos que foram acompanhados, onde em ambos a equipe médica tratou dos agravamentos da doença do corpo físico com grande destreza, mas utilizando-se apenas das evidencias para traçar planos que chegassem o mais perto da cura daquela enfermidade, deixando de fora, porém, o sujeito que o habita e todos os seus medos, angustias e fantasias. Trazemos aqui, dois casos onde questões tratadas como secundárias pela equipe médica, tinham para o paciente uma repercussão na sua identidade social. Foi por meio da intervenção da psicologia que estes pacientes tiveram oportunidade de serem vistos e tratados a partir do seu ponto de vista quanto ao que é secundário e o que é prioridade. Aspectos como comprometimento da fala e oportunidade de falar de si, das suas angustias, das suas fantasias quanto as limitações físicas foram possíveis a partir desse trabalho de escuta, fortalecimento e reflexão. Sem, porém, descuidar do motivo da internação que foi o adoecimento cardíaco. “Portanto, torna-se imprescindível a delimitação de cada saber de forma complementar, sem julgamentos, sendo capaz de agregar os saberes de forma a criar algo novo” (Szpirko, 1999).
SZPIRKO, Jean. Esclarecimento psicanalítico da escuta. Etre malade – Avoir une maladie. In: Santé mentale, n° 38, maio 1999. Tradução: Maria Aline Ramos Ferreira Leal (2002).
2. Universalidade, Equidade e Integralidade em Saúde - 2.2 Interdisciplinaridade na Formação e Atuação Profissional
Caroline da Luz Rodrigues de Souza Vieira, Rosana dos Santos Silva, Elder Vargão Borges