Religiosidade e espiritualidade no contexto hospitalar conforme percepções e experiências de profissionais de saúde
A religiosidade e a espiritualidade têm inegável importância na vida das pessoas. Seus reflexos podem ser observados nos hospitais, onde muitos pacientes e familiares buscam na fé religiosa recursos para lidarem com a doença, a dor, perdas diversas e morte iminente. Neste contexto, podem ocorrer situações complexas e mobilizadoras para pacientes e profissionais, sobretudo quando não ocorre adequada combinação entre procedimentos padronizados e as crenças e valores religiosos. A possível integração entre ambos carece de sistematização prática fundamentada e de lugar institucional para estar mais em consonância com as políticas de humanização do SUS. Uma investigação, apoiada pelo CNPq, foi desenvolvida com profissionais de saúde atuantes no Distrito Federal e nos estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Tocantins, tendo como tema geral a análise de percepções e experiências de equipes multiprofissionais acerca da religiosidade e espiritualidade no contexto hospitalar. O objetivo foi verificar as percepções dos participantes – médicos, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais - acerca de como a religiosidade/espiritualidade aparece nos atendimentos e compreender os modos como eles lidam com estas situações na vida profissional. Os profissionais foram entrevistados, individualmente, segundo roteiro semiestruturado e condução fenomenologicamente orientada, abordando os seguintes temas-eixos: dados demográficos; características da unidade e do contexto hospitalar onde atua; características da clientela atendida; experiências e percepções acerca de quanto e como a religiosidade e/ou a espiritualidade dos pacientes e familiares se fazem presentes no contexto dos atendimentos; modo como lida com estas manifestações; o que considera como boas práticas e más práticas no modo de lidar com a religiosidade e a espiritualidades dos pacientes e familiares; modo como o tema da religiosidade e da espiritualidade e suas relações com a saúde esteve ou não presente em sua formação profissional. Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas. Sobre o material transcrito procedeu-se leitura fenomenológica, orientada pela busca de unidades de significados, bem como elementos convergentes e divergentes em cada um dos eixos temáticos. Os resultados mostraram que a religiosidade/espiritualidade é presença constante no contexto de prevenção e tratamento de doenças, quando os sujeitos muitas vezes compreendem as difíceis situações vivenciadas pelo prisma da sua religião ou se apegam à fé e às suas crenças como modo de manterem a esperança e o bem-estar. Os entrevistados, em geral, ressaltaram a importância do respeito a diversidade religiosa e a necessidade de acolhimento destas expressões dos usuários, com ou sem incentivo direto às mesmas. Acredita-se que a pesquisa conseguiu, além dos dados decorrentes, promover reflexão sobre o tema por parte dos participantes e, outrossim, ressoar em suas práticas, promover mais congruência como sujeito-social e proporcionar uma visão mais integrada e humanizada dos pacientes. Ademais, estudos dessa natureza podem favorecer a construção de uma prática mais integral em saúde, que preze pelo respeito à diversidade e pela valorização dos fatores psicossociais envolvidos no cuidado. Esse simpósio está voltado para a discussão dos eixos temáticos relativos a percepções, comportamentos e formação dos profissionais em relação ao tema em foco, contemplando pesquisadores de três diferentes universidades.
Lilian Maria Borges Gonzalez
Percepções de profissionais de saúde sobre a manifestação da religiosidade e espiritualidade em contexto hospitalar e suas relações com a saúde dos pacientes
Vinte e seis profissionais de saúde de um instituto de atenção à saúde do município do Rio de Janeiro foram ouvidos com o objetivo de sondar suas percepções acerca das relações entre espiritualidade/religiosidade e saúde dos pacientes. Empregou-se entrevistas semiestruturadas, individuais, fenomenologicamente orientadas, em consonância com os temas-eixos informados anteriormente. A maioria dos participantes eram do sexo feminino (23), tinham formação em enfermagem (13) e atuavam em setores voltados para o atendimento de idosos, mulheres, doentes crônicos e usuários de álcool e outras drogas. Os entrevistados afirmaram: perceber manifestações religiosas por parte de pacientes e familiares; ser frequente apresentarem fé e esperança de que seriam curados de uma doença por obra divina, algumas vezes com abandono ou recusa de procedimentos médicos; receber influência de líderes/grupos religiosos; manifestar comportamento religioso para com o profissional, tal como tentar evangelizá-lo e atribuir resultados do tratamento à vontade de Deus, em detrimento dos esforços dos profissionais envolvidos, dando a estes o lugar de “agentes de Deus”. As relações estabelecidas entre religião e saúde/doença foram agrupadas nas categorias relação direta e relação indireta, ambas com aspectos considerados positivos e negativos, sendo que houve predomínio das relações indiretas tanto positivas como negativas. Pode-se apreender que pessoas em tratamento hospitalar podem ter suas manifestações religiosas potencializadas dada a fragilidade, vulnerabilidade e, por vezes, sensação de aproximação com a finitude que o adoecimento acarreta. A pesquisa permitiu o compartilhamento de experiências que, muitas vezes, são silenciadas pelos profissionais, favorecendo suas respectivas elaborações subjetivas e intersubjetivas.
Lucia Emmanoel Novaes Malagris
Abordagem e manejo da religiosidade/espiritualidade dos pacientes na prática profissional no contexto hospitalar
Relata-se aqui o recorte de uma pesquisa que investigou o modo como profissionais de saúde, atuantes em um instituto de atenção à saúde do Rio de Janeiro, lidam com as manifestações de espiritualidade/religiosidade de seus pacientes, averiguando o que consideram más ou boas práticas de assistência espiritual. Mediante entrevistas semiestruturadas, de base fenomenológica, os 26 profissionais apontaram as formas com as quais abordam o tema religiosidade/espiritualidade em suas práticas profissionais. Em relação aos modos usuais de abordar a questão religiosa na prática profissional, cinco categorias foram identificadas: não toca no assunto da religiosidade/espiritualidade, apenas ouve caso o paciente introduza o tema; ouve, reforça e às vezes incentiva questões ligadas a religiosidade/espiritualidade que tenham relação com o tratamento do paciente, porém com o cuidado de não direcioná-los a própria posição religiosa; apresenta ao paciente falas que buscam gerar neste uma reflexão acerca da vivência da religiosidade/espiritualidade; utiliza seus próprios conhecimentos de conteúdos ligados a religião nos atendimentos; desestimula ou coloca limites à apresentação de questões religiosas por parte de seus pacientes. Os profissionais apontaram o respeito às manifestações, opções e crenças religiosas do paciente como elemento crucial na correta atuação profissional frente a suas falas e os comportamentos religiosos, além de não deixar que a própria religião interfira no processo. As práticas consideradas mais inadequadas foram: deixar a própria religião interferir e discriminar pessoas de segmentos religiosos diferentes da própria religião ou que tenha padrões de comportamentos considerados inadequados em sua religião, bem como desrespeitar, criticar, rejeitar ou impor visão/saber.
Marta Helena de Freitas
O tema da religiosidade ao longo da formação profissional em saúde
Em consonância com o que se apresentou na proposta deste simpósio, este trabalho descreverá o recorte específico da formação, apresentando resultados obtidos com profissionais que atuam em hospitais do Rio de Janeiro, Porto Alegre, Brasília e Tocantins, totalizando 100, dentre médicos, psicólogos, enfermeiros e assistentes sociais. Nas entrevistas, de base fenomenológica, foram abordados os seguintes tópicos: se, como, quando, em que disciplinas o tema da religiosidade / espiritualidade foi abordado ao longo da formação; como desenvolveu habilidades para lidar com o tema na prática profissional; recomendações ou sugestões a estudantes ou profissionais iniciantes sobre essa questão. Pouquíssimos entrevistados alegaram ter tido o tema abordado no contexto acadêmico, e, quando ocorreu, foi de modo esporádico e superficial. Muitos alegaram que, pelo contrário, o tema era não apenas evitado, como também considerado pejorativo, danoso e alienante. Dessa forma, as habilidades para o manejo da religiosidade/espiritualidade dos pacientes foram construídas a partir das seguintes situações: com base nas próprias vivências religiosas e ensinamentos familiares; somatório entre o que aprendeu no curso e formação pessoal com o que foi aprendendo, por conta própria, ao longo da experiência prática; aprendizagens ao longo da experiência, com os próprios erros e acertos; como autodidata, frequentando cursos e eventos específicos sobre o tema. Defende-se, portanto, a construção de proposições de instrumentalização e diretrizes para a formação do profissional de saúde que inclua diretamente o tema da religiosidade/espiritualidade, considerando-se as políticas públicas de humanização da assistência, que tem como eixo norteador a interdisciplinaridade e a saúde integral.
3. Intervenções Psicológicas na Rede de Atenção à Saúde - 3.2 Espiritualidade na Saúde
Lilian Maria Borges, Lucia Emmanoel Novaes Malagris, Marta Helena de Freitas