E o racismo entrou no Hospital: o “cheiro do preto” e a política nacional de humanização (PHN)
A prática do racismo institucional afeta predominantemente as populações negras e indígenas, ferindo, principalmente um dos princípios básicos do Sistema Único de Saúde (SUS): equidade. O objetivo deste estudo é abordar, de forma crítica, as práticas de racismo institucional voltadas a usuários negros de um hospital geral, relacionando com a Política Nacional de Humanização do SUS (PNH). A Política Nacional de Humanização, existente desde 2003, serve para efetivar os princípios do SUS no cotidiano das práticas de atenção e gestão, qualificando a saúde pública no Brasil. Tal política é composta por diretrizes, dentre elas cabe aqui citar: defesa dos direitos dos usuários; clínica ampliada e compartilhada e; acolhimento. Nesse sentido, faz-se importante pensar cada diretriz e relacionar criticamente com as práticas adotadas nos serviços de saúde. É necessário pensar a PNH também no âmbito assistencial, ressaltando práticas dos profissionais que lidam diretamente com o usuário, no serviço. O racismo ainda está presente nas relações sociais na sociedade brasileira, influenciando a vida das pessoas, seus funcionamentos psíquicos e o funcionamento das instituições e organizações. O racismo institucional se manifesta por meio de normas, práticas e comportamentos discriminatórios adotados no cotidiano de trabalho, colocando pessoas de grupos raciais ou étnicos discriminados em situação de desvantagem no exercício de seus direitos. Este estudo se deu a partir da reflexão após uma das autoras presenciar um profissional de saúde ressaltando que o cheiro de pessoas negras não lhe agrada. A partir daí, questionou-se: a assistência a usuários negros partindo desse profissional seguirá os princípios da PNH? O usuário negro que receberá o atendimento desse profissional, receberá um serviço que esteja de acordo com os princípios básicos do SUS e com a PNH? Questiona-se ainda: Quando essa fala ecoa e é problematizada juntamente com outros profissionais de saúde, a discussão crítica é bem recebida ou ainda são utilizadas formas de minimizar tal questão? Tais perguntas se fazem pertinentes num sistema de saúde de um país onde ainda se vive o mito da democracia racial e que assuntos referentes à questão racial são pouco ou quase nunca discutidos nos serviços de saúde. A partir dessa ideia, vale mencionar a Portaria nº992, de 13 de maio de 2009 que institui a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, que reafirma os princípios do SUS, vindo atuar como um dispositivo de combate às práticas racistas e discriminatórias nos serviços de saúde, fortalecimento do Controle Social através do Movimento Negro, promovendo a redução das desigualdades étnico-raciais. Nesse sentido, percebe-se que mesmo com todas as Políticas e Portarias, ainda se faz necessária uma discussão em massa e ações de fortalecimento de um atendimento humanizado, respeitoso e acolhedor nos mais diversos âmbitos da saúde, cabendo a todos os profissionais da área colocar em pauta a temática do racismo e combate-lo diariamente nos serviços, entrando em consonância com as políticas, atuando juntamente com a gestão e fortalecendo o protagonismo dos usuários.
BRASIL. Ministério da Saúde. PORTARIA Nº 992, DE 13 DE MAIO DE 2009. Institui a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Disponível em: < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt0992_13_05_2009.html >
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4. Modelos de Prevenção e Promoção da Saúde em Diferentes Contextos - 4.3. Humanização
Eloísa Amorim de Barros, Tassia Cris Sena Liduino