Desafios da equipe multiprofissional acerca da confidencialidade do diagnóstico HIV/AIDS: um relato de experiência
O direito do paciente à privacidade e à confidencialidade já é muito difundido no contexto hospitalar atravessando as temáticas bioéticas. Quando se trata da revelação diagnóstica do paciente portador do vírus HIV/Aids o assunto ganha destaque devido ao estigma e grande preconceito associado. Isto se intensifica, quando o paciente tomado por sentimentos de culpa, medo e vergonha decide manter o “segredo” de não revelar aos familiares e/ou parceiro afetivo/ sexual a condição acometida ao seu quadro de saúde como forma de evitar sofrimento maior. Diante disso, as equipes multiprofissionais vivenciam as tensões envolvidas entre a confidencialidade e suas ressonâncias no vinculo terapêutico. O presente relato de experiência objetiva apresentar os desafios e impasses vivenciados na realização de estágio na área hospitalar incluindo a discussão da relação vincular entre paciente e equipe multiprofissional diante do dilema da confidencialidade diagnóstica. O estágio aconteceu no período de dezembro de 2016 a abril de 2017 em uma enfermaria de infectologia de um hospital da rede pública. As atividades vinculadas ao estágio curricular incluíam atendimento aos pacientes internados, participação nas reuniões multidisciplinares, registro em prontuário e supervisão. Observou-se nos atendimentos individuais e nas reuniões de equipe multiprofissional, composta por profissionais e estagiários, dificuldades quanto à elaboração de estratégias que favorecessem a tomada de decisão do paciente diante da revelação diagnóstica. Foram percebidos tanto nos atendimentos individuais como nos relatos da equipe grande dificuldade em abordar tal questão com os pacientes, especialmente quando eles permaneciam mais resistentes. A resistência ao diálogo é um desafio a ser superado nas práticas em saúde, pois sem comunicação o avanço em pontos cruciais referentes ao processo de hospitalização é dificultado. Foram também notados no estágio que intervenções muito diretivas ou com muita insistência para revelar logo o diagnóstico eram pouco eficazes e abalavam e dificultavam o vinculo necessário na relação entre o paciente e a equipe, podendo comprometer a adesão ao tratamento. Em contrapartida, a elaboração de condutas que permitiam um tempo para o paciente avaliar quando e como gostaria de contar eram mais favoráveis, embora este tempo proposto nem sempre fosse compatível com o tempo subjetivo. A equipe se preocupava em fazer o máximo para ajudar o paciente a realizar a revelação antes da alta, considerando a responsabilidade ética, mas isso nem sempre era possível, pois a decisão de contar era muito particular para cada um. Para estes pacientes a alternativa pensada foi a de acionar a rede de apoio para seguir a orientação e oferta de suporte para quando se sentissem seguros para contar. Considera-se que a negociação entre equipe e paciente é um recurso importante para a diminuição da angustia entre as partes e consequentemente para o aumento da confiança e construção do vinculo para elaboração de estratégias de comunicação em conjunto considerando o caso a caso. Esta conduta facilita a detecção das necessidades do paciente, fornecendo apoio e reduzindo a vulnerabilidade psicossocial, elementos importantes para favorecer as melhorias necessárias na saúde multidisciplinar.
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2. Universalidade, Equidade e Integralidade em Saúde - 2.7 Bioética no Hospital
Universidade Federal da Bahia - Bahia - Brasil
Hevilla Pereira de Oliveira, Cristiane de Oliveira Santos