Urgência, tempo e subjetividade: desafios para o psicólogo hospitalar
Instabilidade e incertezas são termos utilizados para definir socialmente adolescência. São notórias as peculiaridades dessa fase, principalmente se agravadas por modificações abruptas causadas por lesão física grave. A proposta desse trabalho é discutir o caso de uma jovem de 16 anos de idade, diagnosticada com paraplegia renitente às intervenções clínicas adotadas; analisar a intermediação do psicólogo na relação paciente, família e equipe. A paciente recebeu o diagnostico de paraplegia - decorrente de ferimentos causados por perfuração por armas de fogo (PAF), inicialmente recusou os procedimentos clínicos, suscitando na equipe sentimentos de impotência e indignação. A paciente, foi assistida pelo acadêmico de psicologia da Universidade Federal Fluminense, na Clínica Médica do Hospital Ferreira Machado (HFM), situado em Campos dos Goytacazes RJ. As técnicas utilizadas se basearam na Clínica Ampliada (CA), no acolhimento e construção do Projeto Terapêutico Singular (PTS). As ações foram planejadas com a equipe, frente à resistência da paciente em receber intervenções clínicas. Os dados foram obtidos pelas intervenções individuais junto à paciente, análise do prontuário, entrevista com familiares e intercâmbio com a equipe através de estudos de caso. A intervenção psicológica possibilitou a paciente expressar seus sentimentos quanto à hospitalização, procedimentos técnicos e adaptação ao ambiente hospitalar. Sentimento de perda e vulnerabilidade associou-se a imagem do próprio corpo e sua reestruturação simbólica. Diante da angústia, anteriormente não nomeada, pôde, a partir daí, se posicionar frente ao luto. Com as reuniões a equipe lançou um olhar interdisciplinar sobre o caso e experimentou, de maneira coletiva, desempenhar sua função. As medidas informativas e preventivas junto à família mostraram eficácia e facilitaram o acolhimento da paciente no pós-alta. Com base na literatura sobre Psicologia hospitalar e da saúde, articulados a Psicologia do desenvolvimento, consideramos que a adolescência é um período de “transformações e crises”, de tensões que incidem sobre o corpo - potencialmente crítica - quando associada ao enfrentamento de situações de enfermidade e hospitalização. O trabalho em equipe foi a base para a construção e transformação da clínica tradicional em uma Clínica Ampliada. A primeira tem uma tendência a se ocupar somente com a doença e ocultar a pessoa doente. É na proposta de CA que surge o PTS, como um recurso para lidar com a subjetividade do paciente, restituindo-lhe sua autonomia e sua história. O estudo nos permite apontar que as dificuldades como: mobilizar reuniões clínicas com profissionais de diversas áreas, estudo de caso, reuniões com familiares, etc., são desafios ao psicólogo hospitalar. Mesmo no hospital de emergência, onde o tempo cronológico é privilegiado, o psicólogo se oferece para o tempo subjetivo do paciente. Portanto deve estar atento às normas que se concretizam nessas condutas institucionais, permitindo que o mal-estar seja elucidado e o incômodo não seja sufocado na temporalidade.
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1. Cuidados em Saúde nos Ciclos da Vida - 1.2 Saúde Mental do Paciente, Família e Equipe
CARLOS ROSEMBERG SOUZA DO ROSÁRIO, VÂNIA MARIA ROCHA DE OLIVEIRA TATAGIBA